Um misto de decepção e satisfação. É assim que pode se descrever o primeiro dos dois shows que o cantor Wado fez em São Paulo nesta semana. A convite do projeto CCBB Universitário, uma parceria entre a USP e o Centro Cultural Banco do Brasil, o músico de Alagoas fez uma apresentação com cerca de uma hora de duração, gratuito, em plena Rua Maria Antonia, no coração do centro velho da capital paulista.
Em uma tentativa de cativar o público que por perto passava, e tentar fazê-lo perceber as mensagens que canta, Wado privilegiou as canções mais agitadas de seu repertório. O esforço deu em boa parte certo, exibindo um lado bem interessante do conjunto da obra do cantor. Se tal "proposta" não conseguiu juntar uma multidão no MariAntonia, pelo menos fez alguns incautos, como as funcionárias da limpeza do Centro, dançarem e baterem palmas ao ritmo de balanços como "Rap Guerra no Iraque", "Reforma Agrária do Ar" e a divertidíssima "Teta", que foi apresentada ao público como "uma canção de amor" pelo músico.
A decepção, porém, é verificar que um show gratuito, em um horário talvez não tão usual, mas acessível (ao meio-dia), de um músico talentosíssimo, não consegue juntar mais que cinquenta gatos-pingados na cidade que é a maior produtora de música do país. Fica sempre pairando no ar a pergunta sobre de quem é a culpa, ainda mais considerando que o evento foi razoavelmente bem divulgado por blogs, sites e @s da vida.
Do artista, pelo menos, não é. Eu, pessoalmente, sou capaz de dizer que Wado é, dos artistas que apareceram nos últimos dez anos, um que tem um dos melhores projetos artísticos, misturando a canção brasileira tradicional - samba, afoxé, música nordestina - com sonoridades diversas, mas não menos originais - funk, eletro, ragga. Além disso, suas músicas têm pegada, mas têm letras que são inteligentes sem deixar de serem acessíveis - "Cordão de Isolamento", por exemplo, parte de uma crítica simples ao carnaval de bloco espetaculoso de Salvador para falar do conceito de liberdade. (Ou ainda "Estrada", que em seus versos iniciais "sampleia" trechos do romance Terra Sonâmbula, do escritor moçambicano Mia Couto).
Em outubro, Wado lança Samba 808, seu novo trabalho, com participações de Chico César, Marcelo Camelo e Zeca Baleiro, entre outros. Em uma conversa depois do show, o músico disse que o trabalho vem numa linha "mais de samba, mais melancólica, pra ver se o povo gosta e faz sucesso". Se nem música em novela hoje significa alguma coisa - "Alguma Coisa Mais Pra Frente" foi parar na trilha de "Caminho das Índias", da Globo - é um bocado complicado entender o que pode dar certo. Até lá, Wado - e muitos outros - continuam tentando, e fazendo grandes coisas. É ficar de olho pra ver o que pode surgir de bom.
PS: todos os discos do cantor alagoano se encontram disponíveis para download no site.
PS2: a foto 2 do post é de Marcelo Costa, do Scream&Yell. Saiu lá no S&Y um especial meu sobre o CCBB Universitário, com entrevistas com Ellen Oléria e Donatinho, além, é claro, de Wado. Confere lá!
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